quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

De caiaque pela Croácia


Desde que meu irmão passou a ter um pezinho na Croácia (agora ele tem os dois!) que eu tinha vontade de fazer um passeio de caiaque por lá. Certa vez cheguei a pesquisar uma agência que tinha um passeio incrível mas, sem companhia, desisti. Com o convite para o casamento dele em setembro último, busquei na caixa de email as informações que tinha levantado àquela época, convenci o Pedro de que seria o melhor programa para nossas férias e, no dia 16 de setembro (meu aniversário), dávamos as primeiras remadas para cinco dias sensacionais de muito caiaque, trekking, bike, gente especial, bons vinhos e peixe fresco.

O roteiro começa em Dubrovnik, uma cidade patrimônio da UNESCO mas que, no meu entendimento, basta um dia para dar uma volta pelo muro que cerca o centro antigo. De lá sai o ferry para Sipan, uma ilhota a menos de uma hora de lá.

Sudurad e Sipanska Luka têm, juntas, no máximo 400 habitantes. Sudurad é um vilarejo de pedra, extremamente rural/pesqueiro, com uma estrada que leva até o outro lado da ilha cortando toda a extensão de terra. São coisa de 4km.
Sudurad
Ficamos numa guest house encantadora, de um casal de senhores que mora há 45 anos por lá e recebe turistas e familiares nos finais de semana e férias. Plantam uvas, azeitonas, legumes e verduras, fazem seu próprio vinho, licor, azeite e alcaparras em conserva. E são generosos e acolhedores. Não dá vontade de ir embora. Dona Iva (o mesmo dome da minha cunhada!) adorou o Pedro. “Super boy!”. E o marido levou a gente para conhecer os barris e caldeirões com uva recém colhida em fermentação.
Guest House em Sudurad. Abaixo os encantadores donos da casa com o que produzem.

Nosso guia, “Super” Radovan, segundo Dona Iva, já tinha tudo no esquema depois do farto café da manhã num restaurantezinho em frente ao porto. Caiaques, remos, coletes, saias. Tudo da melhor qualidade.
A partir do alto: prontos para partida para a volta em
Lopud. Casa em Lopud e subida até o forte.
O primeiro role foi ao redor de Lopud, ilha que fica bem em frente à Sipan. Deu mais ou menos 20km, um pedaço com chuva, vento e onda; o segundo mais abrigado e com sol ameaçando sair. Não chegou a ser um grande desafio técnico, mas não deixa de ser uma remada para quem já tem calo nas mãos e hábito de ignorar a dor nas costas. Ainda chegamos a tempo do pôr do sol mais surreal da vida – entrando por detrás do altar de uma igrejinha deserta, subindo uma escadaria escura até o telhado.
Portinha no altar que leva ao pôr do sol no teto da igreja em
Sudurad.
Com tempo virando, o segundo dia acabou sendo de trekking ao invés de darmos a volta em Sipan (seriam pouco mais de 20km, acho). Ainda arrastamos Radovan para uma remadinha curta e intensa, cheia de ondas e vento no fim de tarde.
A partir do alto: caminhada de Sudurad a Sipanska Luka e
vilarejo de Sudurad (casas e porto)
No terceiro dia pegamos o ferry para o Parque Nacional Mljet. Um paraíso para quem ama viver ao ar livre. O vento ainda era forte e, novamente, alteramos o programa, puxando o mountain bike para o primeiro dia. Perfeito! Alguns push-bike e trilhas de cascalho, mas boa parte é em estrada pavimentada. Com pausa para mergulho em água turquesa. Uau!
 

Enfim a maior remada de todas, de Polace a Soline, passando por Pomena. Definitivamente, não é um roteiro para iniciantes. Pelo menos não naquelas condições de mar e vento que encaramos. O que, para nós, deixou as coisas até mais divertidas. Tudo bem, foi tanta onda vindo de todos os lados que teve um momento que perdeu a graça, confesso. A chegada depois de 26km com cerveja gelada e uma comida maravilhosa esperando.


O último dia foi de trekking até o pico mais alto do Parque, o Veliki Grad (514m). Subidão dos bons, com uma vista daquelas que faz valer a pena a panturrilha ardendo. E, naturalmente, ainda conseguimos pegar os caiaques para o passeio de despedida, só Pedro e eu, pela baía de Polace.


Mljet é muito bem estruturada, com linhas de ferry partindo de diversas cidadezinhas da costa. Há ônibus internos (não apenas na área do parque) e diversas opções de hospedagem, alimentação e locação de bike ou caiaque. Trilhas bem sinalizadas e bem cuidadas. Tudo isso faz com que dê, tranquilamente, para dispensar guias e agências. Embora nossa experiência tenha sido o máximo e mais do que recomendável. Foram cerca de 700 euros por pessoa por sete dias de hospedagem com café da manhã, equipamento, ferry, transfer em Dubrovnik e cinco ou seis refeições (almoço/jantar. As demais nós pagamos).

Comer: há três restaurantes maravilhosos em Sudurad. Experimentamos todos! Se tiver que escolher um, vá ao Tri Sestre. Em Mljet (Polace) são mais opções, todas muito parecidas. Destaque especial para os mariscos “under the bell” em Soline e o pitstop providencial no restaurantezinho Mali Raj, na minúscula Babine Kuce, à beira do lago, durante o role de bike. No castelo no meio do lago (Sveta Marija) também tem uma pizzaria bacana. Nota: leve dinheiro, pois a maioria não aceita cartão.


Correr, remar e pedalar: A agência Adria Adventure tem bastante experiência na região, com base em Dubrovnik. Equipamentos de boa qualidade e em bom estado. A dona (Ilana) tem jogo de cintura para pedidos excepcionais como hora de chegada/partida diferente, guarda de bagagem, etc. O guia que nos acompanhou, Radovan, dispensa comentários. Super flexível, prestativo e gente boa. Para saber mais dobre Mljet clique aqui. Nas cidades do Parque é possível alugar tudo (bike, barco, etc).

Heston's Fantastical Foods - Fat Duck arrebatador


Voando pela Emirates noutro dia assisti a três programas de TV do Heston Blumenthal. E lembrei que ainda não tinha botado aqui minhas impressões sobre a divina experiência em seu The Fat Duck, na Inglaterra.

Peguei o trem para Bray em abril último, com minha irmã e marido, para almoço num raro sábado de sol inglês. Embora, invariavelmente, a gente costume ser a mesa mais jovem de qualquer grande restaurante, dessa vez a sensação era que todos lá éramos crianças. Graças a “Heston’s Fantastical Foods”, como apropriadamente se chama a série de programetes que vi no voo. “Culinary alchemist Heston Blumenthal brings back the wonder and excitement of childhood food, awakening the child in every viewer”, continua descrevendo o subtítulo. Não surpreendentemente meu comentário para a Elisa e Remy foi exatamente esse ao experimentar o último dos 13 cursos. Como a gente se diverte na casa de Heston Blumenthal!

Sim, eu tenho algumas implicâncias e preconceitos. Mas estou sempre pronta a deixar alguém provar que estou errada. Com Heston Blumenthal foi assim. Tinha ido ao Dinner, “nono melhor restaurante do mundo”, em Knightsbridge/Londres um ano antes e, de verdade, não achei nada demais (veja aqui). Torci o nariz, mas quis tentar o The Fat Duck.

A começar pela recepção calorosa do maitre Dimitri, nossa experiência foi irretocável do início ao fim (ou melhor, eu pararia um pouco antes de chegar o papelzinho de altas cifras em Libras....).

Fomos colocados numa mesa próxima à janela (e não escondidos num canto qualquer do salão). Naquela clima cordial “como vai? Tudo bem!”, contei a Dimitri que estávamos ali para três ocasiões especiais: os 30 anos do meu cunhado, o visto de residência da minha irmã e um novo e importante momento profissional meu – sem, claro, entrar em detalhes.

Optamos pelo menu harmonizado. Já que quem está na chuva...

Irretocável. A cada prato, uma nova descoberta. Brincando com todos os sentidos, como bem deve ser a cozinha que se propõe fazer Heston Blumenthal. Olfato, tato, audição, paladar, visão. E as memórias, sempre elas, fazendo a gente se lembrar da infância, de situações que nada deveriam remeter a uma mesa tão sofisticada.

Nem sou assim tão fã de harmonização em restaurantes (fracassei em todas... sempre acho que não vale à pena e que os vinhos não são melhores do que eu poderia escolher em uma ou duas garrafas). Mas essa (também) surpreendeu. Pela qualidade e quantidade do que foi oferecido. Incluindo saquê quando fomos parar no mar, com direito a barulho das ondas e tudo.

Tomamos drinks congelados, bebemos chá com Alice, mastigamos whisky.  Passeamos por florestas cheias de fog e por tentadoras lojas de doces depois de explorar o oceano. Comemos ovo com casca e tudo. Nas mesas ao redor, casais e amigos sorriam sem parar.

Depois de quase cinco horas, quando nada mais poderia nos surpreender, chega “oficialmente” a sobremesa. Com um “congratulations” confeitado no prato para mim e para Elisa. Curtimos e ainda desdenhamos do Remy, que ficou sem receber seu chamego Heston Blumenthal. Por pouco tempo. Logo veio com o saco de doces um singelo cartão de “Happy Birthday” assinado pelo chef.

O que dizer mais? Arrebatador.


Não entendo muito bem essas coisas de “melhor do mundo”. Mas, para mim, o The Fat Duck está lá no alto (bem acima do impessoal e arrogante Dinner) pelo conjunto estupendo da obra: atendimento, criatividade, sabor. Experiência.

Comer: The Fat Duck, em Bray. Acesso de carro ou trem a partir de Londres (cerca de 1h). Reserva imprescindível. As mesas abrem com dois meses de antecedência.

PS: Abaixo as fotos (feitas pela Elisa). Os pratos têm o sabor na memória mas estão fielmente descritos com o vinho graças ao menu impresso que recebemos em um envelopinho ao fim da refeição. Demaaaais!

PS2: O "Tea Party" e o "Like a Kid in a Sweet Shop" foram tema dos episódios da série na TV que assisti. Vale conferir!

Menu harmonizado do The Fat Duck.


Amuse bouche...
Red Cabbage Gazpacho - Pommery Grain Mustard Ice Cream
Jelly of Quail, Crayfish Cream: Chicken Liver, Oak Mossa and Truffle Toast
... um passeio pela floresta...
Snail Porridge, Iberico Bellota Ham, Shaved Fennel
Roas Foie Gras - Barberry, Braside Kombu and Crab Biscuit
Mad Hatter's Tea Party: Mock Turtle Soup, Pocket Watch and Toast Sandwich
"Sound of the Sea"

Salmon Poached in a Liquorice Gel
Anjou Pigeon
Hot & Iced Tea




A partir do alto: Eggs in Verjus, Verjus in Egg / The BFG "Black Forest Gateau" / Whisk(e)y Wine Gums / "Like a Kid in a Sweer Shop".