quarta-feira, 27 de março de 2013

De braços abertos para a realidade


Foram 44 minutos que valeram como uma aula de sociologia, de humanidade.

Mais do que uma corrida de 5,5km, participar da prova Rocinha de Braços Abertos foi uma experiência impactante.

Sim, existe pacificação. Sim, há classe média na favela (e isso vc nota em alguns prédios bacanudos). Sim, as classes C e D estão consumindo mais (e isso vc vê nas vitrines de grandes marcas do varejo ao longo da estrada principal). Sim, há lixo, há esgoto a céu aberto e há fios embolados prestes a soltar uma fagulha e transformar em cinzas casebres de madeira. E tudo isso vc vê a cada passo no percurso.  Há becos úmidos e escuros e pessoas bebendo cerveja de canudo às 8:15 da manhã. Há gente voltando pra casa depois da noite em claro no trabalho enquanto a turma do asfalto ocupa a Rocinha para correr num domingo de manhã. Há gritos sinceros e divertidos de "não peida não!", "vai, playboy!" e "vai, gostosa".

É tanta informação e tanta emoção em meros cinco quilômetros que nem sei bem como escrever aqui.

Ano que vem eu corro 10k. 

Redgrave e a inspiração



Quem dera eu pudesse ter trocado algumas poucas palavras com Steve Redgrave 16 anos atrás. Com a idade dos meninos das categorias de base do Botafogo que, mais do que isso, puderam remar a seu lado e sentir a energia inspiradora de um pentacampeão olímpico.

"Há quanto tempo você rema?", perguntou Redgrave enquanto assinava para mim sua biografia A Golden Age num sábado de março em que foi participar de uma ação como membro da Academia Laureus na sede náutica do Botafogo.

Uma frase tão simples que me fez pensar lá atrás, naquele primeiro Oito que remei (e venci!) na Regata da Escola Naval em outubro de 1997. Não sabia se respondia "Remo há 16 anos" ou "Não remo mais" ou, pior, "Remar, mesmo, nunca remei". Balbuceei qualquer coisa num inglês tosco, já que a emoção também me impedia de acionar a tecla SAP do cérebro.

Naquele 9 de março Redgrave desceu as escadas de pedra da sede de remo do Botafogo sob aplausos e gritos calorosos de remadores alvinegros de todas as idades, inclusive os meus (a mais linda recepção que Sir Redgrave jamais teve em um clube de remo, segundo o próprio. N.R: isso, pra mim, é ser eterno. O cara parou de remar em 2000 e foi ovacionado do outro lado do planeta por uma geração que sequer era nascida naquela época).

Os mesmos degraus que me levaram à Lagoa pela primeira vez em 1997. Com a primeira remada no tanque nasceu uma paixão incontrolável pelo remo. Ao mesmo tempo em que me contentava em ser uma atleta bissexta devido ao trabalho, aos amores, a tantas desculpas que nunca me deixarão saber como teria sido "se...". A frustração de não saber onde poderia chegado como atleta ainda me agonia. Faltou o que?

Faltou Redgrave.

Depois daquele sábado, voltei a treinar. Lembrando a cada remada o quão privilegiada eu era de estar num barco deslizando naquele deslumbrante cartão postal, com bem observou Redgrave ainda no papo rápido sob sol escaldante. Inspiração é tudo.

Tarde demais? Nunca é tarde.


sexta-feira, 1 de março de 2013

Memória afetiva

Tenho convicção de que os melhores restaurantes do mundo, para você, não são necessariamente aqueles que ganharam estrelas e aplausos alheios. Tampouco obrigatoriamente têm que estar na mídia ou custar uma fortuna. Para você o melhor é aquele que te faz mais feliz. Simples assim.

Seja por um cheiro, um momento ou uma lembrança. Uma garfada especial ou um gole mágico. Esses lugares merecem destaque na nossa memória afetiva.

Hoje vasculhando umas fotos do ano passado, me deparei com algumas images que fiz no Bistrô Benito, em Earls Court, no dia em que fui assistir a um jogo de vôlei nos Jogos Olímpicos de Londres.

Seria mais uma portinha na multiétnica e às vezes caótica Earls Court Road. Mas pra mim não é.


Morei em Londres por seis meses no início do ano 2000. Confesso que não me dei muito bem com a cidade naquele momento. Talvez, hoje reconheço, pela falta de maturidade à época pois hoje acho Londres um lugar incrível.

Fiz de Earls Court minha casa enquanto estudava na London College of Printing e era no Bistrô Benito que me sentia acolhida. Perdi a conta do número de vezes que jantei lá. Sozinha ou não. Seu Benito, que ainda está lá, é o patriarca de uma família italiana que cuida do restaurante com todo esmero e alegria. Em 2000, seu filho Simone estava no salão e, com o tempo, fomos estabelecendo uma pequena cumplicidade. Volta e meia recebia um mimo deles: entrada, sobremesa, vinho, desconto.


Ano passado, ao sentar numa mesinha com aquela garrafa de Perrier servindo de jarra de flor e avistar novamente Seu Benito, me senti como se tivesse voltado para casa. A primeira mordida no pão de alho crocante e a garfada naquele carbonara perfeito com quejo fresco ralado na hora (estou aqui salivando!) me trouxeram sensações de 12 anos antes.


Para mim, o Bistrô Benito é o melhor restaurante italiano do mundo.

Comer: Bistrô Benito - 166, Earls Court Rd (+ 44 20 7370 4857). Metrô Earls Court.