terça-feira, 13 de março de 2012

My concept of hell

Já remei tanto nessa vida que já remei até fora d'agua. O que não é privilégio meu - se é que isso pode ser considerado "privilégio". Se há um pesadelo na vida de qualquer remador ele atende pelo nada atraente nome de remoergômetro. O princípio é o mesmo de uma esteira ou uma bike ergométrica. Só que dói mais.
Claro que esses números não são meus...
Não sei se é por causa dos numerozinhos insanos na tela ou se "somente" pelo tremendo esforço que é "fazer máquina" - é assim que chamamos o ato de remar no dito cujo -, mas o remoergômetro apavora e desafia. Difícil existir outro equipamento de fitness tão eficiente para entrar em forma. Impossível enganar a máquina.

Hoje sentei num ergômetro depois de mais de um ano. Foi sofrido.

O principal fabricante do remoergômetro no mundo chama-se Concept 2. Sacou o trocadilho?
Remar: Há até campeonato mundial de remoergômetro - e o Brasil tem alguns campeões e medalhistas nessa brincadeira de maluco. O Crash-B é disputado anualmente em Boston. Já no Brasil, o campeonato nacional é o CaBra RI, organizado todo ano pela CBR. Tá curioso, então curte esse vídeo aqui.

segunda-feira, 12 de março de 2012

Como na primeira vez

Um grande chef se reconhece pela capacidade de surpreender. Não na primeira vez. Mas na segunda, na terceira, na quarta... Voltei ao Oro há dez dias. Não vou inventar uma "desculpa" para ter baixado, de novo, no salão de Felipe Bronze. Não era aniversário de ninguém. Simplesmente estava com saudade.

Apesar de ser quinta feira, a casa não estava tão cheia. Metade do primeiro andar ocupado e a sensação de que éramos únicos ali, tamanha a cordialidade e o astral da noite: do sempre acolhedor sorriso da Cecilia Aldaz à simpatia de Raul de Lamare, comandante da trupe, passando pela nova e delicada garçonete de sotaque de Portugal e, naturalmente, pelas peripércias de Bronze na cozinha. Uma experiência completa.

Cone de açaí, ovo de codorna e costelinha - sabores de uma noite única. (Fotos do site do Oro).
Reencontramos o maravilhoso cone de açaí com tartar de peixe branco e os paltinhos de moqueca crocantes. Fomos apresentados ao tempura de ovo de codorna com espuma de trufas e à estrela da noite: a costelinha de boi com caramelo de jabuticaba e pure de banana a terra com queijo coalho, outra novidade - de soltar foguetes.

"Tentei trazer a vcs pratos que não tinham experimentado ainda", disse Raul, cuidadoso, para me conquistar definitivamente, mesmo que a harmonização não tenha sido perfeita - estávamos bebendo um Clos de los Siete, argentino maravilhoso, e a maior parte dos pratos era do mar. Who cares?

Felipe Bronze veio à mesa pingar as gotas nitrocongeladas no camarão com chuchu.

"Vocês gostam de lulas?", perguntou e, diante da reposta positiva, emendou. "Vou mandar um prato que estou estando para vcs experimentarem".

Lulas feitas de três maneiras diferente com um "homus" de wasabi. Pedro diz que estava no ponto ideal, eu, mesmo me deleitando com cada pedacinho, senti falta de um pouco mais de provocação do wasabi.

Felipe Bronze promoverá, em breve, uma revolução em seu cardápio. Mas espero que o tartar de mignon com gema de parmesão e fumaça de churrasco continue para sempre. Um dos pratos da minha vida.

"Como assim vcs não comeram o tartar hoje?", espantou-se o chef, em uma de suas aparições. Sorriu e partiu.

E, assim, a degustação de cinco cursos virou sete.

Comer: Oro Restaurante (www.ororestaurante.com)

domingo, 11 de março de 2012

Presente com segundas intenções

Depois de sete anos com dia dos namorados, aniversário e natal, a criatividade para presentes, diria eu, é posta à prova. Ano passado, trocando umas ideias com Papai Noel, decidimos dar ao Pedro um curso de culinária japonesa. Pedi para Elisa (a irmã artista) botar o presente no papel, digamos, e no comecinho de janeiro lá estava o namorado às voltas com algas, facas, peixes e esteirinhas.


Diz ele que é um presente com segundas intenções, já que a "cobaia" para os sushis, sashimis e enrolados sou eu mesma. Eu argumento que não, é um presente para a vida toda, pq o CD se perde, a camiseta desbota... mas o conhecimento fica.

E é esse conhecimento, aprendido nas aulas de Eduardo Jakobsson (clique aqui para saber mais) que divido aqui - em imagens, mais do que palavras - com vcs. Além de ajudante de primeira para cortar e organizar a cozinha, sou uma boa fotógrafa! E super modesta, claro. : )


Pepino
O segredo do pepino (para o vinagrete) é cortar bem fininho. O princípio é o mesmo da salada árabe de pepino com iogurte. Depois de fatiar, tem que deixar um tempo com sal em uma peneira para que ele perca o líquido.

Já as lâminas compridas para o enrolado precisam ser cortadas do lado da casca (escolha pepino orgânico se quiser comer menos veneno!). Ou seja, vai sobrar o miolo do pepino, com as sementes. Não tem jeito, tem que jogar fora.


Para fazer o vinagrete, tem que misturar o vinagre japonês com açucar. Depois é deixar "curtindo na geladeira". Não tem erro.

Califórnia
Fazer enrolados não é das tarefas mais simples, pq requer alguma habilidade com a esteira. É preciso, para começar, plastificar a esteirinha com papel filme. Os ingredientes do Califórnia devem ser cortados bem finos. O arroz é o mesmo do sushi, com a diferença que leva uma camada de gergelim torrado (e ralado) por fora.

No Califórnia, especificamente, a alga fica por dentro e o arroz por fora. Se for fazer um enrolado de pepino ou kani, é o contrário.


Sushi e sashimi


O grande "x" da questão é o peixe para o sushi e o sashimi. Limpar atum e salmão é uma bela de uma roubada, então vale a pena comprar os peixinhos limpos (e frescos, naturalmente!). A boa dica é ligar para Marco Pinto (21 7840-9153), de Niterói, que entrega em casa pescados da melhor qualidade. Serviço de primeira.

A barriga do peixe, que tem mais gordura e, por isso, é mais saborosa, é usada para o sushi. Já as costas são utilizadas para fazer o sashimi.

Leva um tempo para cortar tudo (e preparar as bolinhas de arroz). Nessas horas dá para entender o preço que cobram em restaurantes japoneses (e estou até começando a achar menos caro, viu...).

Arroz
Há alguns truques para fazer o arroz japonês. O primeiro é lavar e escorrer três vezes antes de cozinhar, para, depois de pronto, adicionar a mesma mistura do vinagrete de pepino (vinagre e açucar). Depois de esfriar, tem que soltar os grãos com uma espátula, mas sem quebrar o arroz.


Comer: Para quem quer entrar nessa curtição que é fazer, em casa, comida japonesa, a dica é aprender com o Sushi Rakan (21 9474-9528 / 21 2245-2594, com Eduardo Jakobsson). Além de um programa saudável e divertido, é mais barato do que ir jantar fora.

Enfim, uma canoa para chamar de minha


Só não posso dizer que sou uma caiçara de nascimento pq levei três meses para entrar, pela primeira vez, numa canoa na baía de Paraty Mirim. Foi no colo da minha mãe, com Joãozinho remando. A canoa era o único meio de transporte entre a prainha e nossa casa ali no finalzinho de 1977. Hoje, saibam, não mudou muita coisa. Apenas incluiu no rol de opções a voadeira a motor do Ronaldo (o caseiro-fenômeno) ou o caiaque duplo que estrategicamente deixo estacionado lá para fazer esse delicioso vaivém de não mais de 300m.

Joãozinho, nosso caseiro nos anos 80, foi quem primeiro me ensinou os segredos de remar uma canoa caiçara. Como tirar água, como subir de volta depois de virar, como colocar o remo n'água. Minha canoa era azul e sempre que eu ia a Paraty saía nela para pescar com Caetano, meu irmão, e Edinho e Zé Cláudio, filhos de Joãozinho com Heloísa.

(Pensando bem, agora, talvez tenham sido ele - Joãozinho - e a canoinha azul os responsáveis pela minha paixão por tudo o que se move a remo na água).

Ficamos um período sem ir a Paraty e o barquinho partiu dessa para melhor. Mas já há um tempo eu insistia com Ronaldo que queria comprar uma canoa caiçara. Coisa difícil hoje em dia. As canoas caiçaras são feitas de um tronco único de árvore e as melhores madeiras para talhar estão em áreas de proteção ambiental. Os mestres canoeiros se foram e essas verdadeiras obras de arte são raríssimas.

Foi quando, no dia 31 de dezembro de 2011, fui com amigos remando até o Saco da Velha. Ao chegar na praia, uma linda canoa chamou a atenção estacionada sobre a areia. 'Mestre dos Mares' era seu nome escrito de amarelo em cima da tinta verde do casco, com alguns detalhes em vermelho. No banquinho verde aparecia o nome de Fabrício, provavelmente seu dono. Fiquei admirando e pensei alto: "Nossa, era uma dessas que eu queria".

Marquinhos, bom vendedor que só, estava de orelha em pé e devolveu de primeira. "Ué, ela pode ser sua. Toma o remo, experimenta!", disse ele, sem consultar Fabrício.

Foi paixão à primeira vista. Essas coisas do coração são fogo. Nem chorei o preço. Aliás, ela não tem preço. Combinamos de Marquinhos deixar a canoa e dois remos caiçaras no portinho lá de casa, em Paraty Mirim, até o fim da tarde. Quando cheguei da velejada (voltamos de veleiro!), lá estava ela esperando.


Depois de um ano tão difícil, começar 2012 com a cumplicidade da 'Mestre dos Mares' é especial demais.

Só queria dividir isso com vcs.

Remar: Remar canoa caiçara é tão ou mais complicado do que um Single Skiff ou um K1. Requer uma entrega total ao barco. Uma precisão em cada movimento. Uma confiança na canoa, sua parceira. Os mestres canoeiros, artistas que esculpem os barcos a partir de um único tronco de árvore, e os caiçaras, nativos do litoral sul do Rio (ou Norte de SP) que usam as canoas para se locomover e pescar, são a herança desse patrimônio imaterial brasileiro.


O toque carioca do Azumi, um japa mais do que autêntico

Demorei 34 anos para conhecer o Azumi, 'japa dos japas' em terras cariocas. Foi num jantar de sexta-feira, há coisa de duas semanas. Queríamos, Pedro e eu, comer comida japonesa de verdade, sem essas barcas de sushi ou invencionices tropicais.

Já tinha lido muito sobre o Azumi, considerado a mais perfeita tradução da culinária oriental por essas bandas - uma vez que aqui no balneário não temos nada parecido com a Liberdade paulistana.

Ao entrar, parecia que estava pisando num daqueles vários restaurantezinhos pé sujo de Tóquio, empoleirados em prédios e servidos por elevadores em que mal cabem duas pessoas. Muita madeira na decoração, mesas e cadeiras sem assinatura de designers e espremidinhas umas ao lado das outras, cardápio de plástico, pratos com nomes impronunciáveis (escritos com ideogramas, evidentemente) e olhos puxados por toda parte.

Sentamos no sofa do subsolo (mais Tóquio, impossível), bem ao lado de uma mesa com três homens japoneses que conversavam sem parar, bebiam sem parar e comiam coisas que só aguçavam minha curiosidade. E não fique você pensando que eles estavam atacando califórnias ou sashimis de salmão. Não. Ali no Azumi, pratos quentes são tão (ou mais) populares do que o sushi bar.

Fomos de acelga com camarões refogados e beringela ao forno com molho de misso. O sorriso da garçonete deu a dica que tínhamos começado bem. Senti falta, apenas, de uma carta de saquês mais interessante para acompanhar (eram, se não me engano, apenas três opções).

Enquanto pensávamos na continuação do jantar, baixa na mesa do outro lado um grupo de dois casais jovens e animados. Pareciam já conhecer o lugar - ou, pelo menos, saber que ali vc tem que ousar nos pedidos. Foram perguntando para a atendente o que era isso e aquilo no menu até que param em um tal de Ankimo.

"É fígado de peixe sapo", responde, com toda naturalidade, a moça.

Pedro e eu não aguentamos e caímos na gargalhada. Foi a senha para começarmos um papo com os casais a respeito do tema. Nada mais surreal do que ter algo assim no cardápio, pensamos os seis. E fomos brincando com o tal Ankimo, sem saber que se tratava de uma das maiores iguarias (o foie gras do mar, dizem), raríssimo no Brasil.

Veio nosso pedido do sushi bar (os melhores sashimis que já comi aqui... lembram que falei do Yamazate, estrelado japonês de Amsterdam... pois então... os pratos do Azumi também são tudo aquilo, sem as estrelas do Michelin e a pompa de um hotel cinco estrelas. Fantástico). Ao mesmo tempo, chegam dois potinhos na mesa dos casais.

"Um é para eles ali", aponta um mais animado dos rapazes.

Sim, é exatamente o que vcs estão pensando. Fígado de peixe sapo, muito prazer. Cortesia dos neo-amigos da mesa vizinha. Coisas que só acontecem no Rio de Janeiro.

"Estavam achando que a gente ia encarar essa sozinhos? E não pode fazer cara feia!", emenda o rapaz divertido.

"De graça até injeção na testa! Bom apetite!", sorri uma das moças, grávida.

Arigatô!

Fígado de peixe sapo, cortesia da mesa do lado.
Comer: Azumi (R. Ministro Viveiros de Castro, 127 - Copacabana / 21 2295-1098)