quinta-feira, 30 de junho de 2011

O que você prefere?


Uma coisa que me intriga é como o marketing de um restaurante pode ser o mau humor dos garçons. Tudo bem, o Bar Lagoa (reduto dos cara-amarrada em questão) transcende sorrisos e trombas e, justiça seja feita, a turma da bandeja há muito já diz 'bom dia' pro cliente por aquelas bandas.

Mas continuo com a pergunta na cabeça? O que é mais importante, comida boa ou serviço simpático? Se te tratarem bem, vc releva o ponto errado da sua carne? Um risoto perfeito compensa um serviço de má qualidade?

Pensei nisso pq vivi a situação noutro dia. Aliás, vivo coisas do gênero todos os dias e garanto que vc também. Esses são só dois exemplos.

Fui almoçar com as meninas que atendem o Comitê Paraolímpico Brasileiro - cliente da Media Guide - em Brasília. Um domingo de sol com aquele céu azul que só o cerrado proporciona. Chegamos cedo no Le Jardin du Golf, um casarão à beira do Lago Paranoá, encravado, como o nome diz, num gramadão e frequentado por adeptos do esporte grã fino. O garçom demorou para trazer a carta de vinho. O maitre não fez questão de vir à mesa. O atendente não sabia nada sobre os rótulos disponíveis. Superamos o começo truncado e curtimos, cheias de classe, um rosé levinho, que combinava perfeitamente com o clima e com o grana padano com mel e nozes. Estava tudo bem, apesar dos pesares.

O cardápio todo é tentador, custamos um pouco a escolher e quando, enfim, o maitre veio tirar o pedido, soubemos que naquele 29 de maio havia um especial de nhoque "da sorte": um trio de nhoque ao sugo, outro limão siciliano e um terceiro com camarões. Foi a pedida das três, em que pese a falta de criatividade coletiva. Custou, mas chegou o primeiro (o com molho de tomates). Uma porção degustação na medida, sabor suave e bem feito. Ótimo sinal. Mas o segundo (do limão) não chegava por nada. Cobrei uma vez, lembrei com jeitinho uma segunda... e de repente veio o prato, com aquele jeito que ficou um tempo esperando no balcão. Ainda assim estava uma delícia - e esse era o molho que eu estava com mais curiosidade de provar. Achei que o do camarão não tardaria tanto assim, já que tinha "dado o recado" ao garçom e ao maitre. Precisa dizer que me enganei? Insistentes e gulosas, pedimos a sobremesa (uma versão deliciosa de goiabada com queijo, com sorvete de goiaba e tal), o que quase me custou perder o avião de volta ao Rio.

Apesar de a comida ter sido formidável, ainda tenho minhas dúvidas se daria uma nova chance ao Le Jardin du Golf. Como um todo, a experiência acabou sendo estressante demais, quando a proposta era relaxar com amigas. Não me senti acolhida nem bem tratada. E comer bem posso comer em outros lugares com serviço mais cuidadoso.

Por outro lado, nada como uma gentileza para vc se sentir bem. Foi assim no La Dolce Villa, um italiano de primeiríssima no Itaim/SP. Estive por lá na véspera do feriado de semana passada com minha irmã e duas amigas. Já passava de 22:00 e esse papo de que São Paulo funciona 24h é cascata. Tudo vazio. O Alimentari do Sérgio Arno, bem ali na frente, já tinha fechado as portas e acabamos sem opção no La Dolce Villa. Mal sabia eu que se tratava de um dos italianos "estrelados" da capital paulista. Mas era fim de noite, nós e duas outras mesas já nos finalmentes. Antevi aquela correria contra o tempo com o indelicadíssimo "a senhora quer mais alguma coisa, a cozinha vai fechar"?


Ah, que boa surpresa! Abrimos com calma o Viu Manent Secreto (Syrah 2009). Provamos a bruschetta de tartare (um pouco ácida, mas gostosinha). Depois curti um capellini picante com frutos do mar que estava simplesmente uma coisa! As meninas pediram raviolis e outras massas recheadas que não gosto muito, mas disseram que estavam geniais também. Tudo no nosso tempo, sem pressa e cara feia em volta. Ainda fomos encorajadas a pedir a sobremesa. E ouvimos o garçon das antigas falando que o maior patrimônio do filho dele era o conhecimento, que ele gastava o que podia em escola para o menino. Tinha tudo para dar errado, mas foi uma noite agradabilíssima.

E você, prefere o que?

Alô povão agora é sério!

Agora que tenho dois pulmões de novo, vamos ao que interessa:


Até lá, alguns compromissos na agenda para ver se o corpo entra em forma e o metabolismo dá conta de queimar tudo o que comi nesses dias de ócio.

9/7 - Travessia do Araguaia (Maratona de Canoagem)
24/7 - 10k Corrida das Estações adidas
7/8 - Golden Four Asics São Paulo (Meia Maratona)
11/9 - Meia Maratona de Buenos Aires
16/10 - Maratona de Amsterdam

Portanto... declaro oficialmente aberta a temporada de treinos para a Maratona de Amsterdam 2011!

Remar: Travessia do Araguaia - a prova de canoagem mais antiga do Brasil (ver post aqui no blogue). Dias 9 e 10 de julho, em Aruanã/GO. Inscrições abertas aqui.

Correr: Clique no nome da prova para fazer inscrições e saber mais sobre elas. Corrida das Estações adidas Inverno/RJ, Golden Four Asics SP, Meia Maratona de Buenos Aires e Maratona de Amsterdam.

Comer: Muito carboidrato pra dar conta do recado... 

terça-feira, 28 de junho de 2011

Foi em São Paulo, mas poderia ser NY


Me senti uma mistura da Carrie Bradshaw e Charlotte York, as duas neuróticas do Sex and The City. E olha que nunca imaginei que fosse escrever uma frase como essa.

Estava em São Paulo finalizando os preparativos para a Copa do Mundo de Judô. Sexta-feira, 21:00. Pisca uma mensagem no Whats App: "Tô passando aí pra gente correr 10k no Ibira". Fiquei uns segundos esperando resto da mensagem entrar, tipo assim "foi mal, mandei pra pessoa errada" ou "quer dizer, amanhã de manhã vc topa correr?". Algo mais normalzinho. Mas veio isso: "O Ibira está iluminado agora" e "se sairmos 22:00 corremos até às 23:00 e tomamos uma breja depois". Meu amigo sabia com quem estava falando.

Me senti correndo no Central Park - se bem que a fresca da Charlotte nunca ia dar os trotezinhos dela numa sexta de noite. Foram 60min de corrida que derreteram o peso das semanas mal dormidas, mal almoçadas, mal jantadas e muito trabalhadas. Me surpreendi com a vida que há, mesmo à noite, no Parque do Ibirapuera (um dos meus lugares favoritos em São Paulo desde que aprendi a curtir esse "outro sonho feliz de cidade" lá nos idos de 1997). Tudo bem, não teria ido sozinha bater perna por aquelas bandas. Mas havia casais correndo, jovens andando de skate e patins... uma iluminação que deixa a da Lagoa Rodrigo de Freitas no chinelo e seguranças dando volta pelas alamedas.

Fomos ao Ritz, na esquina do hotel. O barzinho sobre o qual minha irmã tinha falado na véspera - tinha o melhor bolinho de arroz de São Paulo e, claro, eu zoei qualquer coisa dizendo que não sairia pra lugar nenhum pra comer bolinho de arroz, ora bolas.

Meu primeiro Cosmopolitan, estilo Carrie Bradshaw, desceu redondíssimo para acompanhar os divinos bolinhos de arroz do Ritz, o descolado bar no Itaim. Depois partimos pra um tinto chileno, que me fugiu o nome, pra acompanha um capellini com cogumelos muito bem feitinho.

Tudo isso foi em SP, mas poderia ter perfeitamente acontecido em NY.

Correr: Parque do Ibirapuera - o portão logo após o chafariz fecha à meia-noite. Recomenda-se fazer apenas o percurso ao redor do lago durante a noite, mais bem iluminado, mais movimentado e com segurança. Mas não vacile!

Comer: Ritz (R Jerônimo da Veiga 141, Itaim). Pode pedir o bolinho de arroz que vc vai gostar. Os paulistas comem isso até pra acompanhar o hamburguer, vê se pode!

Piratas da Costa Brasileira

Certa vez uma famosa crítica de gastronomia do Rio me disse que, se era para falar mal, mal mesmo, ela preferia nem escrever sobre o restaurante. Mas não resisto a comentar sobre o assalto que sofri noutro dia pelos "piratas" da Marius Crustáceos, no Leme. Tudo bem, o erro deve ter sido meu de ir num reduto turístico (aliás, que lugar cafooonaaaaa). Mas eu queria experimentar o que sempre ouvira falar - a profusão de frutos do mar da melhor qualidade no sistema consagrado por aqui de "all you can eat".

Sentei, comi, fui informada que buffet de sobremesas não estava incluído (apesar de ser um copinho de meia colher de brigadeiro e mini tarteletes de frutas...) e, quando fui pagar quase que o pulmão parou de funcionar de novo, como nos tempos de pneumonia: R$ 150 por cabeça, sem bebidas e gorjeta.

Como assim? A troco de que?

Em Cuba comi lagostas melhores por 20 dólares. Tudo bem, Cuba é Cuba.

Mas se eu for no Satyricon gasto isso também e serei igualmente (ou mais) feliz. Posso comer as maravilhas do meu novo xodó, Felipe Bronze, por R$ 225 (sete pratos). O almoço executivo das sextas, da não menos genial Roberta Sudbrack, sai por R$ 85 (cinco pratos). No Bar  Urca, com direito à vista, duas pessoas comem bem por R$ 50 cada (com cerveja e empadinhas!). Não vou nem entrar no mérito que a dúzia de ostras pescadas na hora na Ilha da Cotia, na Baía de Paraty, custa R$ 10.

Só no Brasil, com essa costa gigante, que comer peixe é caro. Ou melhor, um absurdo como na Marius Crustáceos.


Experiência molecular

A pneumonia não me deixou apenas dois meses de cama. Adiou por 60 dias minha primeira vez com Felipe Bronze e sua cozinha de inovações. Superei dois "preconceitos" de uma vez, digamos assim. Não sei bem o motivo, costumava questionar um pouco o chef garotão, adepto ao jiu-jitsu e que não parava muito tempo em seus restaurantes, apesar das estrelas ao redor de seu nome. Já a tal culinária molecular, praticada com maestria pelo jovem chef carioca, era algo que sequer entendia bem o que era - invencionice espanhola?

Desmarquei duas vezes mas, enfim, me sentei numa das mesas do Oro, no Jardim Botânico. Uma terça feira friorenta e de muito vento no Rio de Janeiro, que espanta os cariocas de qualquer atividade que não seja ficar em casa. No salão éramos eu, Pedro e mais uma mesa de seis. Dez funcionários cuidavam de nós, outros tantos na cozinha, sempre sob a batuta de Bronze, que estava ali em carne, osso e talento. Nosso "personal chef" naquela noite, praticamente.

O que podia ser meio deprê (o-dei-o restaurante vazio) foi uma noite memorável. A começar pela recepção de Cecília Aldaz, a sommeliere argentina, que me conquistou quando a conheci, no fim do ano passado, no evento Natal Bacana promovido pelos amigos Jean e Antônio, do Entretapas. Em meio às travessas de tapas e peru preparadas para crianças de um orfanato para meninos e meninas portadores de HIV, Cecília me falava que vinho bom não tinha que ser caro e que, em suas cartas, eram poucos os rótulos com cifras exorbitantes. E nem por isso menos bons. E o Clos de los Siete que escolhemos comprovou essa teoria.

Pedimos o menu degustação de sete pratos para passear um pouco pela arte de Bronze. Às cegas.

Os "snacks" - como são chamadas as pré-entradas - impressionaram, mas não encantaram. Bem apresentadíssimas e originais, mas não sei se foram servidas na temperatura certa (achei que estavam naquele nem frio, nem quente, como se tivessem ficado esperando no balcão já prontas. Pode ter sido só minha impressão). Um prato trazia profiteroles de queijos do Brasil e licuri (planta do cerrado), o outro era uma releitura do famoso pato no tucupi do norte em versão mais delicada.

Profiteroles de queijo do Brasil com licuri (foto do site do Oro).
Aí começou a diversão para os sentidos.

A "caprese quente/fria", do Primeiro Ato, era assim: uma burrata levíssima no interior, envolvido por uma crosta de tomate. Na verdade, o tomate é desidratado, vira pó e é reconstituído depois. Uma calda saborosíssima de tomate e pesto de baru, quente, quando derramada por cima da capa que cobre o queijo, quebra a casca. Bem, eu que sou louca por queijo e tomate quase morri.

O meu favorito, sem dúvida, foi o foie gras com maracujá e granola, algo que nunca imaginei que fosse possível existir. O prato (nesse caso, a louça) me deixou louca de tão lindo que era - e acho, sim, que a beleza influi no paladar, na experiência de comer. Soube depois que todas são feitas na Europa e vëm por encomenda.

Meu favorito - foie gras com maracujá e granola. (foto do site do Oro)
Surgiu em seguida uma cavaquinha com beterraba e uma gordura de porco crocante que estava saborosa e muito bem feita, mas foi ofuscada pelo que experimentei antes e depois dela, coitada.

Pq brincadeira continua, ainda no Primeiro Ato, com o tartare de carne. Simples, né? Não. Primeiro pq é o melhor tartare que já comi na vida. E, segundo, pq ele vem tampado e, quando abre-se a tampa, levanta a fumaça de churrasco. Carne crua com cheiro de churrasco. Quem manda no seu paladar, afinal? Vc acredita no que vê ou sente?

Tartare com fumaça de churrasco, a "pegadinha" do Bronze. (foto do site do Oro)
E chega o Segundo Ato - a versão elegante, leve e plástica de Felipe Bronze para a carne seca com abóbora: os ingredientes de sempre, um sabor inigualável. Carne seca, abóbora crocante, farofa, cebola caramelizada e... manteiga em flocos.

Não sou uma chocólatra, pelo contrário. Me irrita até ganhar ovo de páscoa. O prato de sobremesas para compartilhar "Tudo Chocolate" - nome auto explicativo - foi o gran finale para, definitivamente, eu enterrar de uma vez por todas os tabus gastronômicos da minha vida: chocolate, Felipe Bronze e cozinha molecular.

A mousse crocante pelo nitrogênio. (foto do site do Oro)
Dentre as cinco ou seis receitas com cacau, a mais memorável foi a mousse de chocolate. Felipe Bronze veio à mesa pela segunda vez na noite apresentar, ele mesmo, seu truque. Claro que é um show "encomendado", mas faz parte. Pareceu espontâneo, pelo menos na nossa noite. Com um toque de nitrogênio, a mousse pastosa ganha uma camada crespa. Crocante por fora, cremosa por dentro.

Bronze estava na cozinha durante todo o tempo em que ficamos na casa (de 20:00-22:00) naquela terça banal e chuvosa, o que é elogiável. Um respeito aos clientes. Sua cozinha criativa, ousada, estudade e bem elaborada me marcou de verdade. Marcou cada uma de minhas moléculas, pq não dizer assim : ). Uma equipe impecável (a começar pelo simpático Raul, que comanda as reservas, passando pela Cecília, os garçons...) fez a casa vazia se encher de vida, com eficiência, simpatia e discrição. Mesmo quando faltou luz na rua toda, o clima continuou perfeito. Bronze deu uma corridinha ali na frente para emprestar uma lanterna ao vizinho e amigo Claude Troigros (minha próxima parada), super bacana, super humano.

Raul desce a escada assim que as luzes se apagam. É quando Bronze está com o nitrogênio na mão para preparar a mousse. "Tá vendo, Manoela, demorou tanto pra vir que faltou luz!", brinca Raul. "Vc é a famosa Manoela?", indaga, simpático, Felipe Bronze. Eu é que digo, Felipe: "Vc é o famoso Felipe Bronze? Muito prazer".

Comer: Oro, de Felipe Bronze. Rua Frei Leandro 20 - Jardim Botânico, Rio de Janeiro. Recomenda-se reserva: reservas@ororestaurante.com / 21 2266-7591. Vai lá e depois me conta!